Após o impacto da pandemia de Covid-19, estamos testemunhando uma profunda transformação nas relações econômicas globais e no papel das instituições internacionais. A ideia de uma globalização que traria prosperidade compartilhada se fragilizou, e o mundo parece estar se movendo em direção a um nacionalismo econômico cada vez mais evidente. Mas quais foram os fatores que levaram a esse colapso do ideal globalista e por que instituições como a ONU e iniciativas como ESG e ODS estão sendo cada vez mais questionadas?
A quebra do ideal globalista
Antes da pandemia, a globalização era vista como um processo irreversível. No entanto, os eventos dos últimos anos demonstraram suas vulnerabilidades. O fechamento das fronteiras durante o Covid-19, o colapso das cadeias de suprimento globais e a escassez de insumos essenciais deixaram uma mensagem clara: dependência excessiva de outros países pode ser uma fraqueza. Empresas e governos, desde então, têm se voltado para a relocalização de suas produções e o fortalecimento das cadeias de suprimento internas. Esta mudança de foco evidencia um retrocesso em relação ao ideal de cooperação internacional.
A pandemia expôs a fragilidade da coordenação internacional e a vulnerabilidade que dependência global excessiva pode gerar. Dessa forma, nações passaram a priorizar estratégias de autopreservação, enfraquecendo o discurso de interdependência econômica.
ONU e ODS: A crise de legitimidade
A Organização das Nações Unidas, fundada sobre a promessa de promover a paz e a cooperação, vem sendo duramente questionada por sua ineficiência em lidar com crises globais recentes. O papel da ONU nas questões de conflitos, como a guerra da Ucrânia, e a resposta insuficiente em crises humanitárias e pandêmicas acabaram por enfraquecer sua imagem. Muitos países passaram a ignorar ou contestar suas resoluções, optando por políticas mais nacionalistas e afastadas do multilateralismo.
Além disso, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, que buscavam endereçar problemas como pobreza e desigualdade até 2030, enfrentam dificuldades de implementação. O impacto econômico da pandemia obrigou muitos governos a priorizarem questões imediatas, como recuperação econômica e segurança energética, deixando de lado compromissos globais que exigem um planejamento de longo prazo. O idealismo do desenvolvimento sustentável, portanto, esbarra na realidade de nações que buscam sobreviver aos desafios internos.
A desconfiança Sobre ESG e o greenwashing
A agenda ESG (Environmental, Social, and Governance) prometia revolucionar a forma como as empresas lidam com responsabilidades sociais e ambientais. No entanto, o cenário pós-pandêmico revelou um ceticismo crescente quanto ao seu real impacto. Pressionadas pela crise econômica e pela inflação global, muitas empresas começaram a tratar os princípios ESG como secundários. Além disso, práticas de greenwashing — onde empresas fingem ser mais sustentáveis do que realmente são — acabaram enfraquecendo a confiança tanto dos investidores quanto dos consumidores.
O custo elevado de adoção das práticas ESG também se tornou um problema. Em um contexto de pressão econômica, muitas empresas, especialmente as de médio porte, consideram esses custos inviáveis, o que fez com que o ESG perdesse força enquanto prioridade corporativa.
De volta ao pragmatismo econômico
Esses fatores nos levam a uma conclusão inevitável: estamos assistindo ao retorno do pragmatismo econômico e do fortalecimento dos interesses nacionais. A era de comprometimento com agendas globais e coletivas dá sinais de retrocesso, com países e empresas optando por estratégias mais pragmáticas e menos arriscadas. Isso não significa que o ideal de globalização tenha sido completamente abandonado, mas sim que o otimismo globalista foi substituído pela necessidade de resiliência e segurança nacional.
Em resumo, a crise da globalização, a perda de relevância da ONU e o questionamento do ESG e dos ODS são reflexos de uma mudança de paradigma. O que se vê é um movimento de reação ao contexto de insegurança e incerteza. Estamos mais voltados para interesses internos, em um cenário que nos faz refletir sobre como enfrentar desafios que são, paradoxalmente, globais e locais ao mesmo tempo.
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